Quando a família recebe o diagnóstico do diabetes em um dos seus integrantes, os papéis de cada pessoa na estrutura familiar são novamente reorganizados. Em muitas famílias, as mulheres são as que ficam responsáveis por cuidar do diabetes dos filhos e os pais mantém um certo distanciamento da rotina cansativa, que envolve o tratamento.
Alguns alegam que não tem habilidades “médicas” para se responsabilizar ou até mesmo acompanhar os cuidados de testes e aplicações de insulina. A história de Rafael Paranhos revela como o nascimento das filhas gêmeas e o surgimento do diabetes o fez assumir, também, o papel de cuidador do diabetes da Jordanna.
Diabetes em Família
Segundo a Federação Internacional de Diabetes (IDF, sigla em inglês) “o diabetes diz respeito à toda a família” e o apoio nos cuidados com o diabetes impacta positivamente no emocional de quem convive com a doença.
Além disso, há também a questão financeira, pois os gastos para o tratamento adequado do diabetes afeta o orçamento doméstico e, consequentemente, a vida de todos na família.
Para Rafael Paranhos, a união dos pais em prol da criança é decisiva. Ele, que é advogado, defende a esposa com uma série de elogios. “Patrícia é uma mulher maravilhosa. Costumo dizer que ganhei na loteria. Super amiga, companheira, trabalhadora, dedicada, enfim, uma mãe exemplar. Também como mãe de uma docinha é sempre atenta a tudo e a todos em casa, sem deixar de cuidar da nossa outra filha que não tem diabetes.”
Jordanna, à esquerda, e Sophia, à direita, com vestidos da princesa Elena do Reino de Avalor, personagem da série da Disney, exibidos durante o aniversário de cinco anos das irmãs.
Sobre o relacionamento entre as irmãs, Rafael nos conta mais detalhamente:
– Como o diagnóstico da Jordanna foi com dois anos e três meses de idade, tanto Jordanna quanto Sophia não tinham noção do que era o diabetes. Não podemos dizer como Sophia encarou o diagnóstico da irmã, pois as duas tinham pouca idade. Mas lembro que quando chamávamos Jordanna para a aplicação de insulina, Sophia sempre se aproximava, beliscava o próprio braço e pedia: Papai, aplica em mim, não aplica na Jordanna não. A gente chorava de tristeza e de emoção, percebendo a ligação que elas já tinham e ainda têm.”
Hoje, Sophia convive bem com o diabetes da Jordanna. Sempre quando vamos trocar o cateter e o sensor, ela se oferece para ajudar. Ela pega a almofadinha de álcool 70% e ajuda a passar no local da aplicação. Procuro dar pequenas tarefas para ela participar também, como pedir para tirar o sensor Guardian do carregador e me entregar.”
Os Médicos e o Diabetes
Rafael conta que diante de toda a angústia que o diagnóstico de diabetes trouxe para a família, um dos piores problemas que enfrentarem foi a falta de informação sobre doença por parte dos próprios profissionais de saúde que os atenderam.
“A pediatra que acompanhava as meninas descartou o diabetes, dizendo ao invés de emagrecer, a doença fazia engordar. Depois, quando fomos para a emergência, os primeiros médicos não sabiam nada sobre diabetes e nos tratavam com desatenção quando começamos a questioná-los”, desabafa Rafael. Além disso, durante o período de internação, Jordanna enfrentou problemas com as doses administradas. Ele conta que foram vários picos de hipoglicemia (21) e consecutiva administração de glicose na veia, causando um pico hiperglicêmico. Diante do ocorrido, foram orientados a procurar imediatamente um médico endocrinologista, capaz de oferecer o tratamento adequado para o controle do diabetes.
Foi no IEDE (Instituto de Endocrinologia e Diabetes do Estado do Rio de Janeiro) que Rafael, Patrícia e a pequena Jordanna encontraram nas doutoras Cristine e Juliana o encorajamento que precisavam para tocar a vida para frente. “Quando fomos acolhidos pelo IEDE, nós só chorávamos copiosamente. Elas, com muita paciência, foram nos explicando sobre o diabetes e mostraram outras crianças DMs, para que pudéssemos ver que Jojo não estava sozinha nessa jornada.”
A Família e o Diabetes
“Não escondemos o diabetes da Jordanna de ninguém”, explica Rafael Paranhos, que convive com o diabetes há quase 3 anos.
Segundo Rafael, ninguém da família tinha informação sobre o diabetes. Foi preciso que eles aprendessem com os médicos, com pesquisas na internet, conversando em grupos de pacientes. A proposta é estudar tudo o que fosse possível sobre a doença, o tratamento e como era a vida de uma pessoa com diabetes.
Hoje em dia eles são capazes de passar informação para outros pais que ainda estão dando os primeiros passos e dão algumas dicas que funcionaram: “Não escondemos o diabetes da Jordanna de ninguém. Pelo contrário. Faço questão de falar sobre os cuidados, o tratamento e os tipos de insulina que ela usava antes do uso da bomba de infusão de insulina. Explicamos o que é a bomba de insulina, o que ela faz, para que serve o sensor, o cateter etc. Também conseguimos conversar sobre o que é a doença e como proceder em caso de hipo, por exemplo.”
Jordanna e a sua “Bombinha” de Insulina
No início, Rafael admite que teve um certo preconceito por desconhecer como funcionava a bomba de insulina. “A Dra. Cristine recomendou por três vezes para iniciarmos a terapia de bomba, mas não queríamos ‘algo pendurado’ em nossa filha, pois tínhamos medo de bullying na escola, por exemplo.”
O que aconteceu foi exatamente o contrário: as crianças não mexem na bomba, não mexem com Jordanna e estão sempre alertando a professora quando a bombinha da Jordanna apita. “Ou seja, as crianças nos ensinam a cada a dia. Nós adultos é quem estragamos tudo (risos), por medo do desconhecido”, explica Rafael.
A experiência com o equipamento tem sido boa, como relata Rafael.
“Hoje eu amo a terapia com bomba de insulina. Acho que melhorou consideravelmente o tratamento da minha filha e, sinceramente, gostaria que fosse de fácil acesso a todos, disponibilizado pelo SUS. Para nós, não é fácil ter o tratamento com a bomba de insulina, já que foi preciso acionar o plano de saúde na justiça para conseguirmos a liminar.”
A familia relatou que o tratamento com a bomba de insulina da Jordanna foi conquistado através de uma liminar, o que significa que ainda não é algo definitivo. Dependendo do julgamento do mérito da ação ao final do processo, ela poderá ter o direito ao tratamento garantido ou não. Além disso, a família paga um valor mensal considerável ao plano de saúde.
Jordanna e o seu Diabetes
Rafael conta que Jordanna tem uma personalidade forte, decidida e responsável. Ele acredita que agora, aos 5 anos, ela começa a entender sua condição. “Ultimamente ela nos questionou o por quê dela ter diabetes e sua irmã não. Tento explicar que não temos uma resposta para isso e que, infelizmente. Conversamos sem esconder nada, como se fosse adulta e reforçamos que estamos proporcionando o melhor tratamento que existe hoje. Não abrimos mão disso, que é cuidar dela. Queremos que, quando ela crescer, tenha consciência do que é o diabetes e de tudo que fizemos por ela.
Mesmo com pouca idade, Jordanna já demonstra que vem enfrentando com coragem e responsabilidade. “Acho curioso a resposta dela quando as pessoas oferecem algo para comer ou beber. Ela já sabe dizer: isso eu não posso comer ou beber, pois tenho diabetes. Outro dia insistiram com um pirulito e ela nos surpreendeu dizendo que só aceitaria quando a glicemia dela estivesse baixa”, conta o pai orgulhoso.